Texto por Bruna Berlitz

Dramas familiares que focam em reconciliação e conexão tendem a oferecer uma empática observação do assunto. E 66 Questões da Lua é mais um exemplo disso, ainda que caminhe durante grande parte do tempo em um terreno mais arenoso.

Nele, acompanhamos Artemis, uma jovem de 24 anos que mora em Paris e recebe um telefonema inesperado de sua mãe. Seu pai está no hospital e ela deve voltar para sua casa em Atenas para cuidar dele. Ressentida com a tarefa, por ter crescido distante de seu pai, ela se reencontra com ele durante um verão emocionante, aprendendo o segredo de por que seu relacionamento foi sufocado.

O longa de Jacqueline Lentzou evidencia com muito êxito a dificuldade de afeição em um relacionamento conturbado. Nessa relação de pai e filha, em que ambos sentem a falta de conexão para viver juntos no dia a dia, fica claro que uma doença emergente dificulta ainda mais. E a diretora explora muito bem os espaços para demonstrar isso. Assim como a autonomia do corpo do pai se deteriora pela doença, observamos comidas apodrecidas em um balcão de sua casa, mostradas em grande destaque. Da mesma forma como Artemis limpa a cozinha, percebemos que a relação entre os dois está deteriorada mas em busca de resolução. Que por mais estragado que seja o vínculo entre eles, ainda há vontade de melhora.

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Mas é claro que os desafios existem, e a realizadora é bem ciente disso. Ela demonstra equilíbrio e veracidade em momentos de tensão, como quando Artemis desaba por pressão e incômodo pela situação. Pois enfrentar uma doença em família já é extremamente difícil, mas quando não se tem um vínculo estabelecido é ainda pior.

Enquanto isso, Jacqueline pontua um incômodo visual muito efetivo para a narrativa. Com muitas cenas de interação com poucos diálogos, a angústia fica clara. Da mesma maneira que os percalços de uma conexão familiar que tenta se reconstruir durante um período complicado.

E então, a subversão deliciosa do longa se constrói, em seu terceiro ato. Articulando sobre um amor que não se expressa, mas está lá presente nos mínimos detalhes. E em sua cena final, o ápice dessa questão se demonstra possivelmente reconciliado, com um simples gesto, mas que amolece o coração.

Filme visto online na 45º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2021.