Filme visto online na 45º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2021.
Um filme feito durante a pandemia, para refletir sobre ela, sem o uso de cenários fechados ou personagens distraídos em seus celulares. Mesmo que o roteiro tenha sido escrito em sua presente forma em 2016, muito antes da pandemia alterar o modo de vida do planeta
Denis Côté encontrou a solução para o bloqueio criativo com Higiene Social (2021) ao levar um número limitado de atores mantendo uma distância de 1,5 do outro durante o filme inteiro, em uma paisagem verde e extensa como principal ambientação.
O protagonista é um jovem chamado Antonin (que o realizador garante nada ter a ver com Antonin Artaud), um assumido ladrão e poeta diletante que recebe acusações de várias mulheres com quem fala de forma distante. A irmã, a esposa, a namorada, uma assistente do ministério e um conhecido casual. Mulheres essas que possuem posturas e figurinos que remetem aos dramas clássicos, misturados às ferramentas atuais – vale lembrar a menção à postagem de Cassiopée no Facebook.
Mesmo que a trama se baseie em histórias de amor, brigas e provocações, os personagens jamais se encostam, nem um passo a mais. Mais teatral do que nunca, os atores gritam entre si para serem escutados, travam duelos sem ferir ninguém e dão rosas que damas que não podem buscar.
O longa naturalmente, lança ao espectador o desafio por um ritmo demasiado pausado dos diálogos e do movimento estático

A distância é forte protagonista, já que em cada cena nem os profissionais, nem as lentes da câmera ousam se aproximar das pessoas. Claro que visto que a natureza faz parte do elenco podemos contar com nuvens cobrindo o sol e alterando a iluminação durante uma sequência. Além disso, é possível ouvir o barulho distante de carros passando fora do enquadramento, sinal claro de que a floresta deve se encontrar próxima de alguma avenida. Mas o mais incrível é que Coté permite que os ruídos invadam a sua obra, enaltecendo ainda mais esse contato com o que é real.
Higiene Social pode ter um homem no papel principal, mas são as mulheres que ditam o seu desenvolvimento, são elas que o expõe ao ridículo por sua aparência, desempenho na cama, caráter, situação financeira, e incapacidade de conseguir um emprego. O humor ridiculariza o conceito de macho alfa enquanto confirma que todas as mulheres possuem autonomia nas narrativas.
Mesmo sem as necessidades de filmagem de uma pandemia, a estrutura única de Higiene Social destaca a mesquinhez e profundidade da humanidade quando as palavras simplesmente não servem. É um olhar mordaz e alegre sobre relacionamentos multifacetados fadados ao fracasso, à repetição e à esperança.